Estou caindo, como se estivesse caindo em Júpiter. Sei que deve haver um fim, mas estou caindo. Quando o chão chegar, quero ter asas para bater asas o suficiente para não morrer, para que essa queda não me mate. Estou descendo em queda livre e, parece-me, há momentos em que caio rápido, como um orgasmo esperado a vida inteira. Às vezes, parece que estou caindo lentamente, como se estivesse curtindo uma doce vingança. Abro os braços e sinto o vento passar por mim. Não consigo brincar de Superman, nem de outra coisa qualquer. Só consigo ser sério, ver as responsabilidades à minha frente descendo comigo, arrastadas por cordas invisíveis. Deveres e preocupações descem como se estivessem acorrentadas ao meu corpo que despenca, indo em direção ao solo, para baixo do solo.
Haverá um momento em que tudo vai acabar, e eu até penso nesse momento. Só não quero atraí-lo para mim agora, já que estou condenado a ir só em direção ao piso. Impostos pesam, crenças religiosas pesam, doutrinas pesam, reverências pesam, viver e morrer pesam. O que é leve? Ter uma esposa, ter um filho, ter um pai, ter uma mãe, ter um animal de estimação. Tudo é ter, não é ser. Sou cristão, isso é o mais importante que me lembro agora. Antes da minha profissão, antes de ser motorista ou piloto, antes de ser amigo de alguém, antes mesmo de qualquer atividade exercida como forma de lazer, de passatempo, lembro que sou cristão. Depois lembro de ser pai e avô... estou caindo.
Existe muita pressão sobre mim. Tudo desce comigo, sobre mim, como uma campa que me acompanha o tempo todo. Ela não me protege, ela me oprime. Uma nuvem se forma lentamente diante de mim, e meus olhos perdem o foco e a nitidez. A queda fica a cada momento mais real. Não consigo me distrair, penso nessa queda horrível. Queria ter asas, porém isso foi negado aos homens. Vou cair até chegar ao fim, e a campa vai cair sobre mim. Essa será a hora do fim.
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